segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Chuva em mim


É tarde da noite. A chuva está quase passando.
Veio pela manhã e se nega a ir embora, persiste. Tento sentir seu delicioso cheiro o máximo de tempo, me debruço tentando alcançar a água fresca e finíssima. Gosto de fechar os olhos e deixar meu rosto sob aquela névoa molhada, geladinha. Um arrepio percorre minha nuca e viaja por todo meu corpo. Adoro essa sensação. Repito várias vezes esse ato, esfregando minha mão direita por trás das orelhas, cabelos, até os ombros. Deixo-me levar por essas ondas de arrepio até vir aquele calafrio inevitável. Fico mais um tempo ali, nesse quase abraço.
Começo a olhar mais atentamente para os fios de um poste a outro. Tenho uma visão linda dos pingos que ali ficaram, caprichosamente pendurados, equidistantes. Por cada ângulo que olho, os pinguinhos assumem uma cor e uma luminosidade. Verde, vermelho, laranja, branco. Um pisca-pisca natalino feito de água.
Durante uns minutos fico sentindo o friozinho e admirando aquela arte da natureza.
Querendo gravar em mim um momento que é capaz de harmonizar meus sentidos.

sábado, 11 de outubro de 2008

Um ponto para começar


Alma opaca

À procura do brilho, de um trilho

Gotinhas de fé

Podem me devolver o horizonte

Que meus olhos molhados

Demoram a enxergar.

Em algum lugar está a fonte

Que me fez ser quem eu sou

Com passos ainda acanhados

Estou tentando encontrar.

Existe uma energia

Uma emoção enorme

Pelo menos na minha gratidão.

O que falta no silêncio

Que há pouco tomou a minha vida

Sobra num outro lado

Que sem que eu esperasse

Tem me confortado.

Tem trazido mais do que um abraço

Mais do que um carinho.

Tem me mostrado que eu tenho um lugar

Que eu tenho um ponto por onde começar.

quinta-feira, 9 de outubro de 2008

MEU TEMPO

Tempo. Você está a meu favor ou contra mim? Não entendo vida só como passar as horas executando tarefas e relembrando todas as cenas vivdas até aqui. Um insistente repassar de todo esse painel. Tanta história...mas sempre lembranças.
Vejo a idade com olhar bem realista. Não é o findar, necessariamente. Mas é o reconhecer que alguns sonhos já tiveram sua época de investimento. Saber sair disso e olhar pra frente com consciência de expectativa é difícil pra mim. Agora. Por ora.
Não sei nada de viver, mesmo tendo nas costas uma bagagem de muitos aprendizados e experiências. O lado doloroso da vida é difícil, amargo e cruel, sim. Quem já não o experimentou? Mas aprender como enfrentá-lo é bem mais complexo do que eu sempre pensei. Para cada circunstância, vejo que meus conceitos anteriores quase não me servem. São desdobramentos infindáveis que se apresentam. Uma imagem que se assemelha a isso é me ver após a arrebentação num mar bravio. Mal a gente se recupera em fôlego e força de uma onda, não há tempo pra respirarmos mais algumas vezes. Somos atingidos por outra onda. Talvez maior, talvez mais turbulenta, mais violenta.
Estou me sentindo assim agora. Ainda não consigo respirar. Acho que nem é o momento, mesmo. Preciso de mim. Preciso me puxar. Preciso olhar pros escombros e pro que está de pé.
Tenho um amor guardado dentro de mim que não posso negociar. Só declarar. Só expor.
Não mereço mais essa melancolia. Esse estado de espera e de não enxergar, de estar só, à noite, num lugar desconhecido. Pisando em terreno instável, escutando vozes que não reconheço. Por outro lado, ouvindo expressões que me repelem e são velhas conhecidas.
Consigo identificar um lado fascinante nisso tudo . O de me sentir transigente. Quanto mais velha fico, mais ganhos tenho nesse aspecto. Todos somos capazes de derrubar convicções maiores que nossa vivência conhece. E dali pra frente, adotar as novas formas e conceitos, introjetá- los.
Quanto mais vivo, mais conheço essa minha capacidade.
Só sei que, um pouco encolhida, meio louca, ferida e sem medo de cair, vou enfrentar esse medo .
Parece que em cada cantinho vou descobrindo um motivo pra me assustar. Mas não volto mais atrás. Não consigo mais recuar. Vou sentir essa dor até o fim.